terça-feira, 12 de agosto de 2014

DE PROFESSORA FEDERAL A PROFESSORA BOLSISTA - UM CALVÁRIO

             Ontem, tivemos a nossa última aula de Língua Portuguesa do curso noturno de Recepcionista de Eventos do Pronatec. Este texto é motivado por uma reflexão mais aprofundada do processo ensino-aprendizagem por que passei em minha longa experiência  dedicada à educação.

         Inicialmente, sofri muito ensinando Matemática, porque escolhi essa profissão por desafio e não por prazer. Se o prazer fosse o grande motivador da minha escolha, talvez pudesse ter ido estudar Direito, Psicologia ou Letras. Quem sabe até continuasse Arquitetura, cujo curso abandonei no 2º ano. Não o fiz, no entanto. Optei por ter pressa e Encantada com a nova descoberta da beleza da Matemática e com pressa em aproveitar créditos, fiz vestibular para Licenciatura em Matemática. Ao final do curso, descobri que não conhecia muito da Área e resolvi me formar em Bacharelado. Concluído o Bacharelado, percebi que a grande dificuldade era lidar com os estudantes, vencer a resistência e temor que tinham pela disciplina, além da falta que tinham de conhecimentos básicos, na escola particular e, principalmente, na escola pública. 

Buscando preencher essas lacunas na minha formação, peguei uma avião para São Paulo onde aconteceria o primeiro Encontro de Educação Matemática - na PUC - e me matriculei na USP para estudar Estatística e Geometria em cursos de férias para professores. O Colégio Alfred Nobel, onde eu lecionava, já através de um contrato formal, se negou a me ajudar nesse processo de capacitação. Na volta, então, respondi a esse não, pedindo demissão dele para me aventurar na Escola Técnica Federal da Bahia. Lá, assumi o cargo de professora substituta após Avaliação de Currículo e Entrevista com uma banca de pedagogos. Foi posto que, após uma avaliação do desempenho dos selecionados, o contrato poderia ser revalidado por mais 6m. Já no final do período de um ano, todo nós, professores substitutos, sairíamos da instituição e seríamos a primeira leva de professores a passarem por um processo de Concurso Público. Como concorreríamos sem qualquer vantagem em relação aos que não tinham participado do processo, unimo-nos em uma tentativa política para que a nossa experiência na instituição fosse considerada. Na ETFBa, eram vários em igual situação à minha: Profa. Ângela Medeiros, Prof. Elias Ramos, Profa. Sarah Dick, Profa.  Ângela Mirante, Prof. Sebastião Filho, Profa. Marlene Socorro, Profa. Tânia Jussara e o Prof. Renato, hoje eleito reitor do IFBA. Confesso que não me sentia confortável em pleitear a nossa permanência, seja porque considerava justa a exigência de Concurso Público, seja porque não queria pedir que legislassem em minha própria causa. A Constituinte, instaurada durante o governo Sarney, decidiu que os servidores, que já estava atuando com contratos precários, seriam efetivados e que, a partir da promulgação da Carta Magna de 1988, não mais seria permitido o ingresso de professores no Serviço Público sem processo seletivo com Avaliação de Currículo, Prova Escrita e Prova Didática.

O fato é que, nessa instituição,  eu permaneci lecionando por 24 anos, sendo cerca de 15 em Matemática, uns 5 em Inglês e uma parte dedicada à Coordenadoria de Comunicação Social. Com 26 anos dedicados à educação, eu me aposentei de modo temeroso, por conta do baixo salário e das poucas perspectivas de vida produtiva e prazerosa em um mundo onde quase tudo é pago. Os amigos também me desaconselhavam a fazê-lo, lembrando-me que há anos era anunciado um plano governamental de capacitação, que poderia me permitir obter os graus de Mestre e Doutor, com suas consequentes gratificações. Porém, eu já estava por demais cansada e doente, para me submeter a um processo emocionalmente desgastante de Mestrado ou Doutorado, para aguardar a aprovação e vigência do plano, fazer o Mestrado em 3 anos e ainda dar um retorno à instituição pelo que me promoveu social e financeiramente. Muito doente e cansada eu estava...

       Hoje, como forma de acrescentar um pequeno rendimento ao meu salário de trabalhadora desvalorizada social e financeiramente, estou ministrando aulas no Pronatec. Ensino nos cursos de curta duração desse programa governamental, de cuja proposta eu divirjo profundamente, seja na concepção de educação, nos recursos e valores oferecidos aos professores e alunos, e no fato dele ser gratuito, sem ser público – o que faz uma diferença enorme, considerando que os recursos, através do processo de gratuidade, são encaminhados para instituições educacionais públicas e particulares que têm a autonomia de uso deles como melhor lhes aprouver. Tenho ministrado aulas para os cursos de Recepcionista de Eventos. Os materiais didáticos que preparamos não são pagos, não há auxílio transporte nem alimentação para os professores, a bolsa oferecida aos alunos não paga suas despesas com transporte e alimentação, não há nenhum recurso didático além de um quadro branco pequeno e pincéis (sequer um retroprojetor é disponibilizado, imagine se haveria data-show e outros que eu desejaria dispor) e, por fim,  não há uma data confiável para pagamento das bolsas, seja para professores ou para alunos. Essas condições têm feito com que menos de 50% dos alunos estejam cursando as primeiras disciplinas. Dentre esses, quantos cumprirão a carga horária de 75% e serão aprovados nelas? 


Concluindo essa novela mexicana, senão com final, ao menos remediado : o  grande ganho hoje e ontem, é a satisfação em perceber que, ao contrário do que propalam os discursos em véspera de eleições, o que há de valorização aos professores são apenas os alunos e o que percebemos ter representado em suas vidas como elementos motivadores dos seus planos pessoais de educação para a vida. 




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