terça-feira, 4 de agosto de 2015

OS POETAS VOARAM...


   


     Domingo, fui com a artesã, Mary Ruse, ao Brechó em benefício da construção das instalações da Creche Tia Nildete, no subúrbio de Salvador. Quem se interessar pela iniciativa da amiga Luiza Alvim, deve levar suas doações e ir ver novas peças a preços ótimos, nos dias 06, 07, 08 e 09, pois o evento fez tanto sucesso, que terá seu 3o. reprise. 

     Ainda na Ceasa do Rio Vermelho, experimentei um delicioso picolé de jaca e minha amiga foi comprar sementes para a sua pequena horta em vasos. Nesse local, havia várias aves engaioladas em exposição, para venda em espaços diminutos. Não resisti e perguntei à pessoa do balcão, provavelmente a dona da loja, se ela sabia, que havia sido proibido qualquer engaiolamento de pássaros na Índia ("PAÍS ONDE A VACA É ANIMAL SAGRADO, AGORA PROÍBE PÁSSAROS NA GAIOLA" no link). De pronto, ela me perguntou, se eu tinha cachorro em apartamento. Eu neguei e ela disse que isso também era confinamento. Concordei com ela, esclarecendo não ser meu o desejo, de que sua loja terminasse, apostando que ela seria capaz de adaptar o seu negócio caso isso fosse realmente cumprido aqui.  Muito educadamente, ela quis saber se haviam sido proibidas tanto a venda quanto a criação e eu lhe confirmei. Sua resposta foi: "Aqui é complicado, apontando para uma prateleira. As tartarugas foram proibidas também e a gente vende porque muitas pessoas procuram... 


     Vejam só: ela não se sente errada em vender, porque as pessoas compram e os que compram não se sentem errados em criar, porque as tartarugas são vendidas. Lembraram-se do ovo e da galinha? Na verdade, eu me esqueci de observar se eles também são vendidos lá. Eis um exemplo de que a culpa é sempre do outro, de que a lei deve valer só para ele. Eis aí o retrato da nossa face mais triste. Aquela que está sendo tão desvelada nesse momento histórico! Foi essa a lógica da escravidão? Lamento e me acalento com os poetas, que já voaram seja em palavras ou NÃO: 

                    


O PÁSSARO CATIVO

                       Olavo Bilac

Armas, num galho de árvore, o alçapão;
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.
Dás-lhe então, por esplêndida morada,
             A gaiola dourada;
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo:
Porque é que, tendo tudo, há de ficar
             O passarinho mudo,
Arrepiado e triste, sem cantar?
É que, crença, os pássaros não falam.
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
             Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:
             “Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que a voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro
             Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
             Tenho frutos e flores,
             Sem precisar de ti!
Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola
De haver perdido aquilo que perdi ...
Prefiro o ninho humilde, construído
De folhas secas, plácido, e escondido
Entre os galhos das árvores amigas ...
             Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pompas do arrebol!
             Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes? Solta-me covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade:
Não me roubes a minha liberdade ...
             Quero voar! voar! ... 
Estas cousas o pássaro diria, 
             Se pudesse falar.
E a tua alma, criança, tremeria,
             Vendo tanta aflição:
E a tua mão tremendo, lhe abriria
             A porta da prisão...
                                            
                          Do livro: Poesias Infantis, Ed. Francisco Alves, 1929, RJ
 




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