sábado, 24 de maio de 2014

É A COPA: SURDA E CAPENGA!

Ontem à tarde, participei da performance ENTRE SALTOS, na qual um grupo de mulheres percorreu as ruas de Salvador, saindo do Espaço Xisto, nos Barris, passando pela Avenida 7, pelo Pelourinho e descendo até o Dique do Tororó. Todas estávamos usando roupas em tons de rosa e vermelho, calçando um dos pés de sapato de salto alto e segurando o outro pé na mão.  

A minha caminhada até o local de saída da Performance foi um belo exemplo do conceito do projeto. Vejamos: 

Solicitaram-me que chegasse às 13 horas. Eu me organizei toda: levar o marido no trabalho, pagar uma conta, fazer supermercado, devolver as compras em casa, sair para o centro em torno das 11 horas, comprar um medicamento urgente, deixar meu carro no estacionamento do Dique (o final do percurso e local mais próximo para chegar às 18 horas na sala de aula), pegar um táxi para almoçar no Grão de Arroz e ir caminhando para o Espaço Xisto no mesmo bairro. Por um ato de desrespeito, não comprei o remédio, não almocei e cheguei lá, no horário, embora estressada, faminta e com muita raiva! Mas afinal, não é assim que vivo sempre? Desrespeitada e correndo ENTRE SALTOS?


A mim, além de muitas dores no corpo, a caminhada suscitou um sentimento, uma dúvida, uma certeza, uma alegria e uma ideia:  
  
SENTIMENTO: o quanto me machuco usando saltos altos.  Nunca soube andar com saltos finos e muito altos. Mas ainda uso alguns, com plataformas e saltos moderados. Amanhã vou me desfazer da maior parte desses também. Ao menos no dia a dia, só usarei sapatos 100% confortáveis. Com problemas de circulação nas pernas e hérnia de disco na lombar diagnosticados há décadas, ainda faço isso comigo?  Por quê?

DÚVIDA: será que existe capital mais desumana com os pedestres do que Salvador? Em que bairro da primeira cidade do país, foram feitas calçadas dignas de se andar por elas? Eu só consigo me lembrar da Avenida. Manuel Dias, na Pituba e de parte da orla da Barra. Mas Salvador não é muito mais do que uma avenida na Pituba e um pedaço da Barra? É justo que depois de 465 anos, o poder público transfira a responsabilidade de fazer calçadas decentes para os próprios habitantes? 
                                                    Quem adivinha quais são as minhas pernas?

CERTEZA: a rua de Salvador não é só o espaço da violência em sua forma física, o é também em sua forma verbal. Éramos 30, a maioria jovens e bonitas. Todas fomos insultadas, porém infinitamente menos do que o foram os 2 travestidos. 


ALEGRIA: um observador gritou: "É A COPA, SURDA E CAPENGA!". (Fiquei pensando tanto na infinidade de casas decimais do número Número piquanto na tentativa do governo de ignorar a revolta da população contra os inúmeros dígitos inteiros do custo da copa e de sua corrupção...)

IDEIA: no carro, mudei o plano de aula. Se as aulas eram sobre Comunicação, como não descrever o evento e discutir as possíveis leituras que dele poderiam ser feitas? É claro que só declarei que participei dele, e qual a provocação planejada pelo grupo PI, no final!

4 comentários:

  1. Vera, amei a postagem, suas alegrias, dúvidas e sentimentos. Você como sempre escrevendo coisas que nos fazem refletir.
    Achei bastante puxado o percurso para se fazer com apenas um sapato no pé. A ideia foi perfeita

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    1. Comadre querida, senti sua falta ontem no recital do "meu" grupo DI VERSOS: Arte Poética Singular. A sala estava lotada pela 3a. vez em que apresentamos na Saraiva do Salvador Shopping. Além do meu marido, os compadres João e Carlito também estavam lá!

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  2. Parabéns Vera a todas voçes pela idéia!!! Que provocação hen! É isso mulheres caminhando sempre, em frente! Seus comentários finais, dúvidas como sempre são muito relevantes. Viva!!!!!

    - Rita de Oliveira

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    1. Rita, bem sei o quanto vc é uma mulher guerreira. Por que não apareceu no nosso recital de ontem?

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